Quarta-feira, 28 de setembro, São Vicente (SP). J.E., que pagou R$ 200 por um aborto, passa mal na clínica clandestina.
O resgate é chamado e a encontra com parada cardiorrespiratória e sangramento vaginal.
A polícia acha lençóis sujos de sangue, medicamentos de uso cirúrgico e instrumental ginecológico.
A menina morre horas depois no Centro de Referência em Emergência e Internação.
No dia seguinte, quinta-feira, morre de parada cardiorrespiratória na Unidade Básica de Saúde de Indaiatuba (SP) outra garota que, segundo a polícia, passou mal depois de tomar o chá “buchinha do norte” para abortar um feto de dois meses resultado de estupro.
Ambas tinham 14 anos.
Até quando o Brasil vai adiar o debate sobre a legalização do aborto? Está parado desde 1991 o Projeto de Lei nº. 1135 de Eduardo Jorge e Sandra Starling, que retira do Código Penal o artigo 124 que criminaliza o aborto. Segundo a relatora Jandira Feghali (PCdoB-RJ):
“O aborto é responsável por uma em cada oito mortes maternas, e o acesso a serviços de aborto seguro poderiam evitar entre 20 e 25% de mortes maternas que ocorrem anualmente nos países em desenvolvimento. A taxa de mortalidade materna teve uma redução significativa em alguns países das Américas quando o aborto começou a ser legalizado no inicio da década de 1970. Um ano após a sua legalização em Nova York (1971), a taxa de mortalidade materna havia diminuído 45%. No restante das Américas onde a legislação foi flexibilizada os dados se repetem. Em Cuba houve uma redução de 60%. Lá o Estado assumiu a responsabilidade pelos serviços. Em Porto Rico a prática do aborto é quatro vezes mais segura que a de um parto, e na Guiana, primeiro país da América do Sul a legalizar o aborto, ocorreu uma redução de 65% nas complicações decorrentes do aborto.”
E no Brasil?
Dados do Ministério da Saúde: em média 250 mil mulheres são internadas anualmente com complicações decorrentes de abortos clandestinos.
Em 1991, o número de curetagens pós-abortamento realizadas na rede pública de saúde ultrapassou 340 mil; 20% em meninas entre 10 e 19 anos.
Em 1997, foram 240 mil internações de adolescentes para realização de curetagem.
Pelo substitutivo de Feghali, parado na Comissão de Seguridade Social e Família, devem ser estipulados prazos para a interrupção voluntária da gravidez; 12 semanas para gestantes, 20 quando for fruto de violência sexual.
O procedimento deve estar disponível na rede pública e nos serviços prestados por planos de saúde.
Só deve haver uma punição para o aborto: quando cometido contra a vontade da gestante.
Enquanto não é votado, meninas de 14 anos morrem.
Foi publicada na revista da Associação Médica Americana uma pesquisa da Universidade da Califórnia que prova que o feto não sente dor até os três últimos meses de gestação; apesar de a estrutura cerebral se formar cedo, ela não funciona antes da 28ª. semana.
Em São Paulo, um aborto “cuidadoso” custa R$ 2 mil numa clínica conhecida de um bairro nobre. É o quanto adolescentes da elite pagam. J.E. pagou R$ 200. Faça as contas.
Se as 340 mil que fizeram curetagem pós-abortamento na rede pública pagaram, digamos, R$ 200 o aborto, movimentou-se uma “indústria” de, por baixo, R$ 68 milhões.
Imagine quanto gera a empreendimento do aborto ilegal no Brasil, e quantos faturam com esse mensalão?
A partir do Estadão. Leia no original
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